Por Soraya R. Cavalcanti
Por incrível que pareça ainda há igrejas que, no terceiro milênio, realizam concílios para discutir se a mulher pode ou não subir ao púlpito. Ao longo dos séculos, tanto em culturas cristãs quanto não cristãs, mulheres de todas as classes sociais tiveram menos poder e independência que os homens da mesma classe. Pessoas sem poder, nem proteção, ficam vulneráveis e acabam sempre por sofrer abusos dos detentores do poder.
No Brasil a taxa de violência continua aumentando, inclusive nos lares evangélicos. O índice crescente de feminicídio pode ser atribuído a diferentes fatores, como o preconceito, o machismo estrutural e o patriarcado, que têm relegado mulheres à condição de marginalizadas e oprimidas. Em agosto de 2006, a Lei n° 11.340, mais conhecida como Lei Maria da Penha, foi sancionada. Ela se configura como a primeira lei voltada exclusivamente à violência de gênero, tratando a questão como de interesse social e público. A violência contra a mulher “resulta ou pode resultar em dano, ou sofrimento de natureza física, sexual ou psicológica”.
A Lei Maria da Penha foi um dos maiores avanços para a afirmação dos direitos das mulheres no Brasil. Contudo, o que se vê diariamente em noticiários é o aumento substancial das estatísticas desse tipo de comportamento, agravado no período da pandemia da covid-19. As motivações por trás desses episódios violentos são as mais variadas, como tentativa de controlar a autonomia e o corpo da mulher movido por um sentimento de posse; de limitar sua emancipação econômica, profissional, social ou intelectual; visão da mulher como objeto sexual; e ações de desprezo e ódio pela mulher e por sua condição feminina.
A pesquisadora Valéria Vilhena aponta para o trágico fato de que 40% das mulheres em situação de violência (psicológica, moral, patrimonial ou física) atendidas pela pelo Núcleo de Defesa e Convivência da Mulher Casa Sofia se declaravam evangélicas. Quando a cultura religiosa se omite sobre a opressão que caracteriza o patriarcado, está favorecendo o crescimento da violência doméstica. Quando pastores e outros membros de igreja silenciam – e também silenciam as mulheres mesmo cientes de abusos domésticos, contribuem para a escalada dessa violência, que pode chegar ao ato extremo.
O discurso teológico predominante é o da submissão da mulher ao marido, sem considerar que Efésios 5-6 e outros textos admoestam que deve haver sujeição de “uns para com os outros”. O chamado para servir é para todos. E isso não significa subalternidade, como é pregado e exigido para a mulher, mas igualdade de valor diante de Deus.
*Soraya R. Cavalcanti é professora e psicóloga, e mestre em Serviço Social pela PUC-Rio. Servidora pública, atua como coordenadora do Programa de Capacitação Continuada Capacit Mulher. É colaboradora do livro "Espiritualidade no chão da vida", pela Editora Mundo Cristão.
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