Especialista afirma que proposta está no Senado e pode excluir o agronegócio da obrigação de cortar emissões de gases; se isso não acontecer, as rotinas da agricultura e pecuária serão impactadas

A ministra da Agricultura, Marina Silva, disse em Davos, durante o Fórum Econômico Mundial, que a regulamentação do mercado de carbono é uma meta. O presidente do Ibama, deputado federal Rodrigo Agostinho (PSB-SP) afirmou que o mercado de carbono, na avaliação dele, deve ser aprovado no Congresso ainda no primeiro semestre do ano. Segundo a revista Veja, a regulamentação deve estar expressa no projeto de reforma tributária do governo Lula. Ou seja, são várias as indicações que reforçam os trabalhos no sentido de chegar à regulação desse mercado. O mercado de carbono pode ser regulado ou voluntário. O regulado significa que uma lei vai criar a obrigação de os setores da economia reduzirem as emissões, isso ainda não existe no Brasil. No voluntário, empresas definem, de forma espontânea, que vão cortar emissões. Cada crédito de carbono é igual a 1 tonelada de gás carbônico (CO2) evitada ou capturada. O agro é um dos setores que mais deve ser impactado pela regulação do mercado de carbono pela longa cadeia que abriga. Os efeitos, positivos ou negativos, dependerão do texto da lei que será aprovado no Congresso e, também, das diretrizes ambientais que ainda serão definidas pelo novo governo.

O agronegócio brasileiro tem potencial incrível de virar um exemplo para o mundo, me disse Fábio Galindo, CEO da FutureCarbon Group. “Podemos ser exportadores globais de crédito de carbono. É importante regular do jeito certo. Com os marcadores e padrões internacionais que fortaleçam e incentivem o mercado. Isso vai permitir que produtores tenham renda adicional com a monetização da floresta em pé e poderemos gerar crédito para todos que adotam práticas sustentáveis” explica Galindo. A proposta de regulação, segundo o coordenador do Observatório de Bioeconomia da Fundação Getúlio Vargas, Daniel Vargas, está no Senado e o texto em tramitação pode excluir o agronegócio da obrigação de cortar emissões. Excluir o agro da obrigação de cortar emissões é uma boa medida, pois leva em consideração o caráter essencial da atividade, que é a produção de alimentos, e considera o lado preservacionista na adoção de práticas agrícolas já consagradas. No entanto, uma fonte especializada em meio ambiente e agronegócio me alertou que é cedo para acreditar que o texto desobrigará o agro de cortar emissões de gases. Se isso não acontecer, haverá um desafio importante a ser superado, afinal, as rotinas da agricultura e da pecuária serão impactadas.

Hoje, o Brasil possui uma meta de reduzir em 50% as emissões de gases do efeito estufa até 2030 e de atingir a neutralidade das emissões até 2050. Para alcançar esses resultados, dentro do mercado de carbono regulado, haverá a contratação de objetivos setoriais e planos para implementar as mudanças. O que significa, segundo a consultoria Agroicone, que não está descartada a possibilidade de criação de alguma meta de redução das emissões para as indústrias, como frigoríficos, tradings e empresas de fertilizantes, o que eventualmente poderia afetar o produtor na ponta da cadeia. É preciso ficar atento para que não sejam adotadas medidas míopes que vilanizem a produção de alimentos em prol da agenda verde, a exemplo do que temos visto em países como a Holanda (estatização de fazendas para cumprir meta de redução de emissões), Canadá (proposta de reduzir uso de fertilizantes nitrogenados para cortar emissões), Sri Lanka (adoção de agricultura 100% orgânica com proibição de adubos e defensivos químicos), por exemplo.

O diretor da Agroicone, Rodrigo Lima, não prevê movimento semelhante aqui no Brasil. “A linha de atuação para reduzir emissões do agro deverá caminhar no sentido de estimular a produção eficiente, como o plano ABC+ já sinalizado pelo governo”, afirma. Esperamos que as boas práticas na agricultura sejam consideradas como parte do compromisso brasileiro de reduzir emissões de gases de efeito estufa, meta assumida na COP15 em 2009. Afinal, desde 2011, o Brasil adotou o Plano Agricultura de Baixo Carbono para incentivar as práticas de conservação de solos, sistema de plantio direto, recuperação de pastagens degradadas e Integração Lavoura-Pecuária-Floresta e dá exemplo nessa matéria. A potência agroambiental brasileira poderá gerar créditos e oportunidades de negócios na agenda ESG que está no foco de várias empresas globais.

A nova era gerará desafios regulatórios, de mercado e de conhecimento prático. Segundo dados da McKinsey, apenas 6% dos agricultores afirmaram participar de um programa de carbono, apesar do potencial do Brasil. Concordo que há oportunidades, mas também acho cedo para afirmar que haverá apenas boas notícias nesta nova era do mercado de carbono. A questão regulatória para redução de emissões de gases pode reservar surpresas, como se as áreas que exigem preservação não fossem elegíveis para gerar crédito de carbono. Já imaginou? Espero que o Brasil não tome essa direção e aproveite positivamente o ativo agroambiental que possui.


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