Na aridez do sertão baiano, com armas em punho sob o sol escaldante, tropas avançam prontas para dizimar civis e enfrentar jagunços que têm como trunfo o conhecimento geográfico - e a capacidade de sobreviver em situação miserável. A fome, a desidratação, as feridas abertas, as privações de sono e descanso rondam ambos os lados, assim como os urubus se aglomeram ansiosos pelas sobras dos embates.
Por esse cenário inóspito, Roosevelt Colini, que assina como R. Colini, convida o leitor a uma jornada de sobrevivência no livro Entre as Chamas, Sob a Água. O romance histórico retrata a brutalidade da Guerra de Canudos, em uma terra banhada em sangue e desesperança, onde a dignidade é arrancada e a humanidade se esvai.
No meio desse massacre, que eviscerou ambos os lados, o protagonista, um jovem combatente do exército brasileiro, perde a empatia, a fé e o propósito. Acostumado às estratégias militares que forjaram os heróis nos campos de batalha, ele logo percebe o despreparo e a incompetência do exército para aquele cenário.
O livro mostra que, sem instrução acerca do comportamento dos jagunços na guerra, o pelotão é surpreendido por um “inimigo invisível”. Para sobreviver, o soldado atravessa a trincheira e passa a combater os próprios colegas, enquanto sucumbe à solidão e ao odor podre da guerra.
O personagem principal de Entre as Chamas, Sob a Água descreve na calada da noite os horrores que vivencia, com um pequeno lápis em papel. Para não ser descoberto, relata o drama no Arraial em francês, língua incomum aos envolvidos no conflito.
Presenciar a barbárie das degolas, as condições insalubres nos acampamentos, as dores causadas pela fome, sentir o cheiro ocre do sangue misturado a fezes, urina e suor, arrancam a civilidade do protagonista, tornando-o cada vez mais solitário e silencioso. Nesta nova realidade, ele recebe a alcunha de Chico Mudinho e passa a conviver com personagens históricos, como Antônio Conselheiro e João Abade.
Colini, autor do romance Curva do Rio, obra elogiada pela crítica e pelo público, prova que ainda existe um universo humano a ser explorado, interpretado e atualizado em relação a essa batalha histórica.
O escritor oferece uma vigorosa composição literária para marcar uma parte da história brasileira que não deve ser esquecida. A saga do jovem oficial do exército não nos deixa esquecer de homens, mulheres e crianças que tiveram a existência apagada pairando entre o fogo e as águas que afundaram Canudos.
Sobre o autor
Colini é um escritor que andou fazendo outras coisas por 30 anos e que faz agora meio século de idade. Quando o vagalhão de 1968 acabava de deixar suas últimas espumas na praia e recuava com força ao mar, arrastando aquela geração de volta para as utopias irrealizadas e deixando o cheiro de maresia e AIDS na década de 1980, Colini participou da última leva do movimento estudantil não-profissionalizado. Depois, foi jornalista por dois anos na Folha de S. Paulo e então decidiu batalhar grana virando empresário. Estudou Filosofia e Ciências Sociais na USP, mas não conclui nenhum dos cursos. Escalou dois dos sete cumes mais altos dos continentes: Elbrus e Kilimanjaro. Montou uma operadora de telecomunicações, mas há três anos, delegou a gestão da empresa. Escreveu três romances e dezenas de contos. Daqui para frente, sua vida será focada na escrita.
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